As desventuras de Badger
Já era a quinta ou sexta caneca de cerveja que o halfling atarracado fazia desaparecer em segundos e era a promessa de que mais outras cinco ou seis as seguissem, que fazia Mary continuar a ouvir paciente os lamentos absurdos do pequenino:
“Cê num faz ideia da saudade que eu tenho de casa moça… O que eu não daria pra poder voltar pra minha rocinha…” resmungava ele começando a ficar embriagado, os pés balançando nervosamente a uns bons centímetros do chão enquanto ele se derramava sob o balcão.
“Eu era só um camponês, sabe moça, tava voltando pra casa tranquilo, depois de um dia recolhendo feno, sonhando com um banho e talvez uma caneca de cerveja na taverna da Rosinha, quando vi dois vultos espancando alguém caído, eu podia ter deixado pra lá e fingido que não era comigo, eu devia ter feito isso, na verdade, mas podia ser um vizinho, um amigo, um parente sabe moça? Eu cresci naquelas terras aprendendo que ali todo mundo cuida de todo mundo… Esqueci que depois que o Império chega num lugar as coisas mudam…”
“Eu me aproximei com a minha lanterna e gritei, os homens que tavam batendo, que agora para meu desespero vi serem soldados do Império, se distraíram pra olhar pra mim e quem quer que fosse que estivesse apanhando aproveito pra sumir no mundo.” Ele termina a caneca com um gole longo, limpa a espuma e pede outra. Espera até a cerveja ser servida e prossegue “Não preciso dizer que os soldados não gostaram nada de perder a vítima deles, e como o infeliz fosse muito ligeiro para ser perseguido, eles vieram pra cima de mim.” Um sorriso triste brota na face entorpecida do pequenino, se olhar se perde como se tentando clarear as memórias. “Obviamente eu tentei fugir, mas minhas pernas se embolaram, pra não cair eu firmei o garfo que eu tava carregando no chão como apoio, nessa hora eu senti um tranco forte e algo quente e viscoso escorrendo pelo cabo do garfo… Um dos soldados que via atrás de mim não conseguiu parar quando eu parei com o garfo tão de repente e agora a arma perfurava seu pescoço! Eu berrei de pavor com a ideia do que fizera e larguei a arma e o corpo dele caiu em cima de mim. Bem a tempo de amortecer o golpe do segundo soldado que vinha como louco golpeando o vento, eu nunca havia sentido tanto medo na minha vida!”
Tentando me desvencilhar do cadáver, eu acabei puxando a espada curta dele, o que acabou sendo uma sorte enorme, pois no movimento de puxar eu acabei a erguer bem alto bem a tempo de aparar outro golpe do outro soldado. Aparei outros dois golpes por instinto, reflexo ou pura sorte, mas vi que ele tentava me encurralar contra uma parede, tentando escapar eu pensei em mergulhar pelo meio das pernas dele e depois fugir, parecia um bom plano e quase deu certo, mas eu tropecei de novo e no reflexo de pôr os braços na frente do rosto para evitar a queda me esqueci de estar com a espada na mão que por algum desígnio infernal do destino acabou achando a virilha do maldito soldado, com a força do meu peso o talho foi brutal deixei o homem gritando no próprio sangue e tremendo de medo fugi na noite escura sabendo que nunca mais poderia pisar na minha vila e rezando para que meus vizinhos não sofressem por minha causa, nas semanas seguintes descobri que minha cabeça foi posta a prêmio “O Pequeno Demônio de Colina Verde’’ é como me chamam por aí e por várias vezes precisei contar com essa espada roubada, minha adaga e muita sorte pra viver sabe moça, um punhado de ouro pela cabeça de um Pequenino é o tipo de oferta que atrai os piores tipos sabe moça?”
“Para bem ou pelo mal a sorte assassina que me pôs nesse caminho não me abandonou, me envolvi em várias brigas com caçadores de recompensas, soldados e bandidos e sempre de algum jeito minhas lâminas encontram os lugares certos e a dos meus inimigos não.” Parece uma maldição, azar tremendo para achar confusão, sorte maior ainda pra sair delas vivo e com isso vou ficando famoso e atraindo mais lutas e mais mortes… Mal o pequenino fechou a boca, um anão rude no salão quebrou uma caneca na cabeça de um tipo mal-encarado, a confusão logo chegou ao balcão e revirando os olhos o pequenino entrou em outra briga que não queria…
